Descubra como os vinhedos se adaptam às mudanças climáticas, harmonizando abordagens tradicionais e inovadoras com ações coletivas, com a Maison Arnaud Boué apresentando a produção em larga escala de seus vinhos excepcionais com práticas sustentáveis
O setor de vinhos há muito tempo é associado à tradição, ao luxo e à indulgência. No entanto, sob o verniz da elegância está um setor particularmente vulnerável aos impactos das mudanças climáticas, que ameaçam um negócio global que representou US$ 489 bilhões em 2021.
As videiras são uma das culturas mais sensíveis ao clima do mundo. O aumento das temperaturas pode alterar significativamente os sabores e as características do vinho, afetando a qualidade e a consistência da produção. Eventos climáticos extremos, como furacões, secas, inundações e temperaturas recordes, têm se tornado cada vez mais comuns, afetando os produtores de vinho em todo o mundo. No entanto, o problema é mais grave na Europa, que responde por 45% das áreas de cultivo de vinho do planeta.
Um excelente exemplo é o Vale do Rhône, na França, onde as mudanças climáticas causaram uma alteração drástica no ciclo local da videira. Intrinsecamente ligado às variações de temperatura, o ciclo da videira sofreu uma aceleração significativa. A brotação, que marca o início do crescimento dos brotos, agora ocorre 15 dias antes do que há meio século. O início de outros estágios essenciais, como a floração, ocorre em média 12 dias antes. O "veraison" (o período em que as uvas mudam de cor e iniciam o amadurecimento) e a colheita subsequente agora ocorrem aproximadamente 18 dias antes do cronograma anterior.
Embora os operadores de vinhedos tenham antecipado as mudanças, seu ritmo acelerado fez com que muitos se debatessem com as consequências. Com as uvas amadurecendo mais rapidamente, determinar os tempos ideais de colheita se torna cada vez mais difícil. Os novos padrões climáticos levam a uvas menores, resultando em vinhos mais doces e com maior teor alcoólico. Para manter a qualidade do vinho, os produtores devem adaptar suas práticas para levar em conta essas mudanças induzidas pelas mudanças climáticas no cultivo dos vinhedos.
Em resposta aos desafios impostos pelas mudanças climáticas, muitos produtores de vinho adotaram a sustentabilidade como um princípio fundamental em suas operações. O emprego de produtos químicos e aditivos artificiais para gerenciar o crescimento da uva pode potencialmente lidar com as mudanças no clima. No entanto, eles têm um custo, pois afetam negativamente as qualidades organolépticas do vinho (cor, sabor, aroma e textura). Como resultado, as práticas agrícolas orgânicas e regenerativas ganharam força considerável ao reduzir a dependência de pesticidas e fertilizantes sintéticos, promover a biodiversidade e melhorar a saúde do solo, o que representa uma mudança nas práticas modernas de vinificação.
Maison Arnaud BouéA Maison Arnaud Boué, uma empresa do portfólio da 2Future, destaca-se por seu compromisso com o uso da agricultura orgânica e da biodinâmica para produzir seus excelentes vinhos. As práticas agrícolas orgânicas evitam totalmente o uso de produtos sintéticos, substituindo-os por práticas alternativas, como lavoura ou capina, e empregando apenas alguns produtos enológicos selecionados durante a vinificação.
A viticultura biodinâmica, uma filosofia profundamente enraizada em práticas agrícolas holísticas, enfatiza o equilíbrio do ecossistema e a interdependência de solos, plantas e animais. Esse método considera os ritmos celestes e os ciclos lunares para o plantio, o cultivo e a colheita, enquanto preparações específicas enriquecem o solo e aumentam a vitalidade das plantas. Essa abordagem enfatiza fortemente a relação harmoniosa entre o vinhedo e o ambiente ao seu redor, com o objetivo de criar um ecossistema autossustentável e diversificado.
Os produtores de vinho também têm adotado cada vez mais a agrofloresta. Também conhecida como vitifloresta, essa abordagem envolve, entre outras práticas, a incorporação de árvores e arbustos nativos nas parcelas e/ou bordas dos vinhedos. Essa prática contribui significativamente para um ecossistema mais saudável. As árvores aumentam a retenção de água e a qualidade geral do solo, fornecendo nutrientes essenciais por meio da decomposição das folhas e do afrouxamento do solo com suas raízes. Elas também enriquecem a diversidade de insetos, o que aumenta a polinização cruzada. Além disso, as árvores atuam como quebra-ventos naturais, limitam as geadas e oferecem sombra, ajudando a moderar temperaturas extremas. Estudos científicos confirmam que o aumento da variedade de plantas e animais diminui o impacto da mudança climática sobre as plantações.
Os produtores de vinho também notaram que essas práticas podem afetar positivamente o sabor e o aroma dos vinhos. Muitos viticultores elogiam o "frescor adicional" dos vinhos produzidos por meio da vitifloresta. Pesquisas do INRAE (Instituto Nacional de Pesquisa para Agricultura, Alimentação e Meio Ambiente) indicam que a agrossilvicultura pode, de fato, moderar o rápido amadurecimento da uva e promover um melhor desenvolvimento aromático.
Até 2021, 75% da área de vinhedos de Bordeaux foi certificada como orgânica por meio de uma abordagem ambiental. Isso marca um passo coletivo em direção à sustentabilidade, refletindo uma tendência crescente de esforços ecológicos colaborativos em vários terroirs franceses. Por exemplo, a associação Arbres et Paysages en Gironde promove ativamente a criação de sebes e árvores rurais. Ao mesmo tempo, a Big Ensemble busca plantar 300.000 árvores nos vinhedos de Bordeaux até 2024, com o objetivo de envolver todas as propriedades da região até 2030.
Outras iniciativas internacionais que transcendem os limites de vinhedos individuais incluem o Porto Protocol, que funciona como uma plataforma sem fins lucrativos que abrange toda a cadeia de valor vitivinícola. Por meio de percepções práticas e conhecimento compartilhado, essa iniciativa capacita o setor vitivinícola a enfrentar coletivamente as mudanças climáticas e promover práticas sustentáveis. Da mesma forma, a IWCA (International Wineries for Climate Action) é uma aliança coletiva de vinícolas dedicadas a descarbonizar o setor vinícola global.
Certificações mais amplas, como a B-Corp, quevalida práticas de negócios que vão além das operações e abrangem ingredientes, a cadeia de suprimentos e os impactos na comunidade e nos trabalhadores, entre outras práticas, também estão ganhando destaque entre os produtores de vinho do mundo todo.
Os exemplos destacados demonstram como os setores podem se transformar e se adaptar para proteger o futuro do nosso planeta por meio de uma combinação de ações individuais, esforços coletivos e uma combinação de práticas tradicionais e inovadoras. A jornada coletiva rumo à sustentabilidade do setor vitivinícola é um modelo convincente para outros setores, demonstrando a viabilidade da produção em larga escala que minimiza os danos ao planeta e preserva a qualidade do produto.