Para muita gente, as organizações autônomas descentralizadas representam o futuro quando se fala em organizar pessoas na internet. Para fazer a diferença a longo prazo, elas devem focar nos interesses dos usuários
A ideia de um novo tipo de estrutura organizacional, construída com blockchains descentralizados, surgiu nos últimos anos como um componente central do Web3. Ela é conhecida como DAO (organização autônoma descentralizada, em inglês), termo que, para muitos, representa o futuro quando se fala de organizar pessoas na internet. Entre as várias formas de Web3, como plataformas cripto ou redes sociais descentralizadas, videogames play-to-earn, que recompensam os jogadores com tokens, e plataformas NFT, as DAOs inauguram uma nova era da economia digital, livre de intermediários e pertencente a criadores e usuários.
Em resumo, uma DAO é um modelo de governança orientado pela comunidade, baseado em smart contracts (programas de computador hospedados e executados em uma rede blockchain). De modo geral, as DAOs são criadas e administradas por grupos de indivíduos com um propósito em comum. Esse propósito pode incluir investir em startups, construir uma empresa descentralizada ou organização sem fins lucrativos, criar e vender NFTs, etc. Tudo é possível.
Mas o que mais importa sobre as DAOs não é sua definição. O fundamental aqui é como elas podem atingir seus objetivos, alavancando ideias inovadoras e negócios transformadores.
Existem dois princípios básicos que regem uma organização autônoma descentralizada quando se trata da cooperação e criação de valor para membros:
Tokens são ativos digitais que permitem que dados e valores sejam transferidos, armazenados e verificados com segurança, graças à tecnologia blockchain envolvida. Em uma DAO, os tokens constituem um meio de recompensar as contribuições feitas para o propósito da organização. Quanto mais tokens as pessoas que integram a DAO obtêm e acumulam em suas carteiras blockchain, mais expandem seus direitos de voto em questões importantes para o DAO. Portanto, indivíduos com tokens de uma DAO são stakeholders da organização.
Para entender melhor como as DAOs funcionam, podemos observar um exemplo fornecido pelos autores QuHarrison Terry e Scott Keeney no livro"The Metaverse Handbook":Innovating for the Internet's Next Tectonic Shift", no qual eles discutem várias inovações emergentes do blockchain e da Web3, incluindo as DAOs. A DAO Krause House, organizada em torno da missão de adquirir um time da NBA, é mencionada no livro como um protótipo das coisas incríveis que uma organização autônoma descentralizada pode alcançar.
Mais do que simplesmente arrecadar fundos, o propósito dessa DAO envolve diversas outras ações. Eles precisam de sistemas para o marketing e para aumentar a rede de participantes. Precisam criar apresentações eficazes da sua proposta para mostrar a times da NBA e seus atuais proprietários, criar uma organização interna e definir como a Krause House recompensa os participantes. Para isso, eles desenvolveram o token $KRAUSE, que por enquanto só pode ser obtido por quem contribui para os projetos internos da DAO. Por exemplo, você ganha um token se for um membro registrado e fizer uma postagem sobre a Krause House em um blog. Ou, se você criar ou contribuir com o design da apresentação da DAO. E assim por diante...
Pelos planos, quando a Krause House estiver suficientemente organizada e pronta para o próximo passo, ela começará a vender uma parte de seus tokens para arrecadar os fundos necessários para comprar um time da NBA. Todos que comprarem tokens ou o ganharam devido a contribuições para a missão da Krause House, terão uma parte correspondente do time da NBA que a DAO eventualmente comprar. Todo o projeto pode parecer utópico ou irreal para alguns, mas demonstra como mesmo uma DAO extremamente ambiciosa pode se traduzir em ganhos ao longo do tempo.
Existem desafios e uma diferença significativa entre teoria e prática ao transformar o conceito das DAOs em uma organização viável. Por exemplo, considere questões de governança. Com um modelo de governança baseado em tokens, no qual os participantes com mais tokens têm mais poder de voto, alguns poucos ou apenas um participante endinheirado poderia iniciar uma estratégia de “aquisição hostil” —minando completamente a filosofia da DAO.
Foi o que aconteceu recentemente com uma DAO chamada Build Finance. Um membro que acumulou uma quantidade significativa de tokens fez uma proposição e usou seus direitos de voto desproporcionais para assumir o controle das finanças da DAO. De acordo com a Build Finance, o perpetrador transferiu os tokens da DAO e fugiu com cerca de US$ 470.000 em fundos.
Para evitar um cenário como esse, as DAOs devem adotar regras e um processo de tomada de decisão que proteja a organização de riscos e perigos. Uma alternativa está em adotar um modelo em que o direito de voto também considere indicadores de desempenho sobre o que os membros estão oferecendo à comunidade e evite decisões que não sejam do interesse mais amplo da organização.
Embora existam tarefas difíceis pela frente, é conveniente lembrar dos obstáculos passados enfrentados durante a evolução de muitos software e da própria internet. Duas décadas atrás, reunir pessoas para criar algo online, em tempo real, simplesmente não era possível. Hoje, é lugar comum. Os modelos de tecnologia e governança evoluem para atender às necessidades.
As DAOs são tão atraentes por causa da ideia que incorporam: dar incentivos aos primeiros usuários e dividir os esforços necessários para construir algo verdadeiramente revolucionário. As redes sociais mais populares de hoje poderiam ter evoluído de forma diferente se fossem DAOs, beneficiando muitos de seus usuários junto com seus fundadores. Imagine se a tecnologia necessária estivesse então disponível: toda vez que os usuários conseguissem reunir mais pessoas ou criassem conteúdo viral, seriam recompensados com tokens que acabariam virando ações da empresa.
Esse cenário é possível hoje em novas plataformas sociais emergentes ou serviços no metaverso, desde que adotem uma abordagem sistemática para definir recompensas viáveis.
O desenvolvimento de uma internet descentralizada é uma obra em progresso e as DAOs podem, sem dúvida, ser responsáveis por grandes mudanças na forma como novos serviços ou negócios são criados. Para fazer isso, eles devem garantir que sejam verdadeiramente geridos de forma comunitária, aberta e transparente, tornando-os confiáveis para quem deseja se juntar à iniciativa.
Acima de tudo, como em todo projeto Web3, as DAOs precisam atender a uma premissa da Web3: dar aos criadores e usuários uma forma concreta de monetizar suas contribuições e, simultaneamente, democratizar as recompensas para todas as pessoas envolvidas.
